Meses atrás lia apenas elogios para Joaquim Barbosa em sites
puxa-saco de petistas, principalmente quando discordou de Gilmar Mendes quando
este ainda era o presidente do Supremo. Era um “Cumpanhêro”, imaginavam, e
“Cumpanhêro” com o “C” maiúsculo não incrimina e até protege os crimes e
delitos do outro, pela causa maior, até entendendo o direito de roubar do povo
para defendê-lo dos ladrões dos outros partidos, entenderam? Não entenderam? É
assim: o petista militante idealista quando assume um cargo público rouba os recursos
públicos destinados a algo, por exemplo a obra de uma estrada, para proteger o
povo dos ladrões de recursos públicos destinados às estradas. O Mensalão também
pode ser explicado assim, e os “cumpanhêro” entendem, mas parece que não deu certo
com Joaquim Barbosa. Leia a matéria desta semana de J.R. Guzzo, na Veja, para
entender o que deu errado.
“Ratos e homens”, por J.R. Guzzo (Veja)
Quando o
ex-presidente Lula indicou o nome do procurador Joaquim Barbosa para o Supremo
Tribunal Federal, em 2003, aplaudiu a si mesmo por mais esse lance da
genialidade política que lhe é atribuída.
Tornava-se, com isso,
“o primeiro presidente deste país” a levar um negro à mais alta corte de
Justiça do Brasil – o que não é bem assim, pois antes de Barbosa o STF teve
dois ministros mulatos, já esquecidos na bruma dos tempos.
Mas o que vale nas
coisas da política, em geral, é o que se diz – e o que se disse ali é que havia
um plano magistral.
O novo ministro,
agradecido pela honra recebida, seria um belo amigo do governo nas horas
difíceis. Acontece que os melhores planos, muitas vezes, não acabam em bons
resultados; o que decide tudo, no fim das contas, são os azares da vida.
O grande problema
para Lula foi que o único negro disponível para ocupar o cargo era Joaquim
Barbosa – e ali estava, possivelmente, uma das pessoas menos indicadas para
fazer o que esperavam dele.
Para começo de
conversa, Barbosa dá a impressão de detestar, positivamente, o rótulo de
primeiro “ministro negro” do STF.
Não quer que pensem
que está lá para preencher alguma espécie de “cota”; a única razão de sua
presença no STF, julga o ministro, são seus méritos de jurista, adquiridos em
anos de trabalho duríssimo e sem a ajuda de ninguém.
Nunca precisou de
ajuda da “comunidade negra”, nem da secretaria de igualdade racial, ou coisa
que o valha. Também não parece se impressionar, nem um pouco, com gente de
origem humilde.
É filho de um
pedreiro do interior de Minas Gerais, tornou-se arrimo de família na
adolescência e ao contrário de Lula, que não bate ponto desde que virou líder
sindical, em 1975, Barbosa começou a trabalhar aos 16 anos de idade e não parou
até hoje.
O ministro, além
disso, é homem de personalidade notoriamente difícil, sujeita a ásperas
mudanças de humor e estoques perigosamente baixos de paciência.
É atormentado por uma
hérnia de disco que lhe causa dores cruéis e o obriga muitas vezes a ficar de
pé durante as sessões do STF. É, em suma, o tipo de pessoa que se deve tratar
com cuidado.
Lula e o PT fizeram
justamente o contrário.
Quando Barbosa se
tornou relator no processo do mensalão, em 2006, continuaram apostando todas as
fichas na histórica impunidade com que são premiados no Brasil réus poderosos e
capazes de pagar advogados caros.
Descobriram, agora,
que o trabalho de Barbosa puxou as condenações em massa no julgamento do
mensalão – e jogou uma banana de dinamite no sistema de corrupção que há dez
anos envenena a vida pública no Brasil.
A primeira trovoada
séria veio quando o ministro aceitou a denúncia da procuradoria contra os
quarenta do mensalão. Na época, o único deles com cabeça foi o
ex-secretário-geral do PT, Sílvio “Land Rover” Pereira; não contestou a
acusação, foi punido com prestação de “serviços comunitários” e acabou
resolvendo seu caso a preço de custo.
Os demais, guiados
pelo farol de Lula, preferiram ficar debochando.
Durante todo o tempo,
ele sustentou que o mensalão “nunca existiu”. Quando o julgamento começou,
disse que não iria acompanhar nada: “Tenho mais o que fazer”.
Delúbio Soares,
operador-mor do guichê de pagamento do esquema, afirmou que tudo iria acabar em
“piada de salão”.
O presidente nacional
do PT, Rui Falcão, garantiu que o povo estava interessado, mesmo, é na novela
das 9.
O que queria com
isso?
Imaginavam que
Joaquim Barbosa, trabalhando como um burro de carga, com a tortura da dor nos
quadris e seu temperamento de porco-espinho, estava achando engraçado que o seu
esforço era uma palhaçada inútil?
Lula e sua tropa
tinham certeza de que o processo iria se arrastar até o Dia do Juízo Final.
O ministro Barbosa,
hoje, poderia dizer: “Não contavam com a minha astúcia”.
No caso, sua astúcia
foi entender a diferença entre “muito tempo” e “nunca”.
Tudo seria demorado,
claro. Mas ele tinha certeza de que terminaria o seu trabalho – e que os 80% de
popularidade de Lula, aí, não iriam servir para nada.
Em sua curta obra
prima Ratos e Homens,
um dos clássicos da literatura populista americana, John Steinbeck se inspira
num antigo poema escocês para nos dizer que os mais bem cuidados planos deste
mundo, sejam feitos por ratos ou por homens, são coisas frágeis; podem ser
desfeitos pela roda do acaso, que é indiferente tantos aos projetos mais
humildes quanto aos mais ambiciosos, e só acabam deixando mágoa e dor.
Joaquim Barbosa
talvez faça com que os mensaleiros se lembrem disso por muito tempo.
FONTE:
http://prosaepolitica.com.br
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